TJMG - As informações destinadas ao consumidor devem ser claras em linguagem comum

Tribunal de Justiça de Minas Gerais TJ-MG - Apelação Cível: AC 0548107-92.2006.8.13.0188 Nova Lima - Inteiro Teor. As informações destinadas ao consumidor devem ser claras em linguagem comum

 
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - INFORMAÇÕES ADEQUADAS E CLARAS - DIREITO BÁSICO DO CONSUMIDOR - PRINCÍPIO DA INFORMAÇÃO, DA TRANSPARÊNCIA E DA BOA-FÉ CONTRATUAL - VIOLAÇÃO - VIOLAÇÃO - INDENIZAÇÃO DEVIDA. 1. Nos termos do Código de Defesa do Consumidor é direito básico do consumidor receber informações adequadas e claras sobre os produtos comercializados pela empresa. 2. Deve ser o consumidor indenizado pelos prejuízos sofridos sempre que violados os princípios da informação, da transparência e da boa-fé contratual.(TJ-MG - AC: 10188060548107001 Nova Lima, Relator: Maurílio Gabriel, Data de Julgamento: 02/06/2022, Câmaras Cíveis / 15ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 10/06/2022).


APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0188.06.054810-7/001 - COMARCA DE NOVA LIMA - APELANTE (S): AUTO POSTO PÉTALA AZUL LTDA - APELADO (A)(S): NEUMAN & ESSER AMERICA SUL LTDA, ACE SEGURADORA S/A

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 15ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em REJEITAR A PRELIMINAR SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES, DAR PROVIMENTO AO RECURSO E JULGAR IMPROCEDENTE A LIDE SECUNDÁRIA.


DES. MAURÍLIO GABRIEL

RELATOR.
SESSÃO DO DIA 19/05/2022

DES. MAURÍLIO GABRIEL (RELATOR)

V O T O

Cuida-se de "ação ordinária" ajuizada por Auto Posto Pétala Azul Ltda. contra Newman & Esser América do Sul Ltda. Em preliminar de contestação, Neuman & Esser América do Sul Ltda. denunciou da lide à seguradora ACE.

A sentença prolatada, em sua parte dispositiva, encontra-se assim lançada:

"Ante o exposto, julgo improcedente o pedido inicial. Condeno o autor ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, o qual fixo em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Julgo extinto, sem resolução do mérito, a denunciação à lide, conforme art. 385, IV, CPC. Condeno o denunciante ao pagamento dos honorários advocatícios, o qual fixo em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), conforme art. 85, § 8º CPC".

Os embargos de declaração apresentados por Auto Posto Pétala Azul Ltda. (f. 622/625) foram rejeitados na decisão de f. 630.

Não se conformando, Auto Posto Pétala Azul Ltda. interpôs recurso de apelação alegando que a análise dos gráficos apresentada no laudo pericial "é capaz de comprovar que o apelado apresentou proposta de compra e venda de compressor que prometia um determinado consumo energético que não condizia, em hipótese alguma, com a realidade".

Destaca que "os gráficos constantes da proposta comercial vinculam o proponente".

Informa que o "laudo pericial também concluiu que o gráfico da proposta não seria verídico mesmo se houvesse o irreal consumo de 300.000m³ de GNV por mês".
 
Ressalta que restou "violado o princípio da transparência, positivado não art. 6, III, do Código de Defesa do Consumidor, aplicável ao caso em questão, tendo em vista que o apelado" não forneceu "em sua proposta comercial, informações verdadeiras, objetivas e precisas".
 
Defende que "os gráficos apresentados pelo apelado demonstram um consumo de 0,133kwh por m³ de GNV comprimido, índice bastante vantajoso e que influiu decisivamente na celebração do negócio de compra e venda".
 
Pugna, ao final, pelo provimento do recurso, julgando-se procedentes os pedidos iniciais.

Em contrarrazões, ACE Seguradora S/A bate-se pela manutenção da sentença.

Em contrarrazões, Neuman & Esser América do Sul Ltda. suscita, inicialmente, preliminar de não conhecimento do recurso, por intempestividade. No mérito, requereu a confirmação da sentença.

Intimado sobre a preliminar, o apelante manifestou-se pela tempestividade do recurso (f. 695/698).

Após a sustentação oral, pelo Advogado do apelante, peço vista.


SESSÃO DO DIA 02/06/2022

DES. MAURÍLIO GABRIEL (RELATOR)


Preceitua o § 4º do artigo 1.003 do Código de Processo Civil que, "para aferição da tempestividade do recurso remetido pelo correio, será considerada como data de interposição a data de postagem".

Por isto, "se remetida a petição pelo correio, a data que importa é, à evidência, a do registro, não a do recebimento no tribunal: a remessa pode ser feita no último dia do prazo e, ainda que o seja antes, talvez não haja tempo suficiente para a chegada dentre do decêndio, ou ocorra demora anormal, casada pelo mau funcionamento do serviço, que de modo algum se concebe que prejudique a parte" (STJ - 1ª Turma, REsp 636.272, Rel. Min. Luiz Fux, j. 02.12.04).

Examinando os autos, constato que a decisão que rejeitou os embargos de declaração foi disponibilizada no Diário do Judiciário Eletrônico no dia 9 de abril de 2018, segunda-feira, tendo sido publicada no dia 11 do mesmo mês e ano (quarta-feira), como se vê pela certidão exarada à f. 630.

Dessa forma, o prazo recursal de 15 dias úteis que se iniciou no dia 12 de abril de 2018 (quinta-feira) encerrou-se no dia 3 de maio de 2018, tendo em vista a suspensão do expediente forense no dia 01 de maio de 2018.

Desse modo, tempestivo se mostra o recurso de apelação, cujo registro de postagem data do dia 3 de maio de 2018 (cf. f. 634 - verso).

Rejeito, pois, a preliminar de não conhecimento do recurso, suscitada em contrarrazões.

Por isso e por estarem presentes os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Afirma o autor que, baseado em proposta comercial apresentada pela empresa ré, efetuou a compra de equipamentos necessários a comercialização de GNV no valor de R$ 600.493,00 (seiscentos mil, quatrocentos e noventa e três reais).

No dia 01 de abril de 2004, as partes firmaram "Contrato de Prestação de Serviços de Manutenção em Estações de Compressão de Gás Natural para Veículos (GNV)" por meio do qual a requerida se obrigou à manutenção preventiva do equipamento pela contraprestação mensal de R$ 3.200,00 (três mil e duzentos reais) (cláusula quinta às f. 39).

Informa o autor que somente efetivou a compra do equipamento em razão do consumo de energia que lhe foi apresentado, qual seja, "0,133kwh por m³ de GNV comprimido, relação bastante atrativa" (f. 04).

Todavia, com o passar do tempo, apurou-se que os números apresentados não condiziam com a realidade do consumo, sendo este mais que o dobro mencionado na proposta comercial.

A matéria posta em discussão, por dizer respeito a fornecimento de serviços se encontra regida pelo Código de Defesa do Consumidor.

Dispõe o referido Diploma Legal ser direito básico do consumidor "a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre riscos que apresentem" (item III do artigo 6º).

Discorrendo a respeito, Cláudia Lima Marques, Antônio Herman V. Benjamim e Bruno Miragem observam:

"O direito à informação assegurado no art. 6º, III, corresponde ao dever de informar imposto pelo CDC nos arts. 12, 14, 18 e 20, nos arts. 30 e 31, nos arts. 46 e 54 ao fornecedor. Este dever de prestar informação não se restringe à fase pré-contratual, da publicidade, práticas comerciais ou oferta (arts. 30,31,34,35, 40 e 52), mas inclui o dever de informar através do contrato (arts. 46, 48, 52 e 54) e de informar durante o transcorrer da relação (a contrario, art. 51, I, IV, XIII, c/c art. 6º, III), especialmente no momento da cobrança da dívida (a contrario, art. 42, parágrafo único, c/c art. 6º, III), ainda mais nos contratos cativos de longa duração, ... pois, se não se sabe dos riscos naquele momento, não pode decidir sobre a continuação do vínculo ou o tipo de prestação futura, se contínua; se não sabe quanto pagar ou se houve erro na cobrança ou se está discutindo quanto pagar, necessita a informação clara e correta sobre a dívida e suas parcelas. Neste momento informar é mais do que cumprir com o dever anexo de informação - é cooperar e ter cuidado com o parceiro contratual, evitando os danos morais e agindo com lealdade (pois é fornecedor que detém a informação) e boa fé". (Comentários ao código de defesa do consumidor: arts. 1º a 74: aspectos materiais Cláudia Lima Marques, Antônio Herman V. Benjamim, Bruno Miragem. São Paulo: RT, 2003).
 

Como visto, é direito básico do consumidor a informação precisa, adequada e esclarecedora sobre o produto ou serviço.

Ademais, "os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração" (artigo 113 do Código Civil), devendo ser anulados os negócios jurídicos "quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio" (artigo 138 do Código Civil).

Depreende-se das conclusões do laudo pericial que:

"O compressor examinado se encontra plenamente atuante, sem qualquer tipo de defeito mecânico, contudo esta mesmo superdimensionado para a diminuta vazão de GNV comercializada pelo posto da empresa requerente.

Pela ampla pesquisa efetuada e os dados técnicos levantados, pode-se tranquilamente afirmar que se houvesse uma demanda (consumo) de 300.000m³ ou mais de GNV/mês no posto da autora e seis bicos na estação de bombas, vide simulações A e B anteriores, o sobredito compressor poderia estar operando dentro de suas especificações técnicas de projeto.

O número de bicos instalados refere-se à logística do posto da requerente, ao passo que deveriam ter sido realmente propostos 06 bicos, ao invés de 04, como consta na proposta comercial" (f. 340).

Verifica-se, ainda, que em resposta ao quesito 06 o perito é enfático ao esclarecer que:

"Pela proposta comercial, esta bem clara a performance do compressor relativamente à demanda de gás veicular por ele fornecido. Realmente não há nada descrito na seção 6 dessa proposta comercial no que diz respeito a uma quantidade pequena de GNV comercializado pela empresa autora e muito menos sobre paradas e partidas do compressor, para que os valores apontados no gráfico sejam atingidos" (f. 333).

Não bastasse, ainda em resposta ao mesmo quesito o expert destaca que:

"O certo é que, se houver uma demanda (consumo) de 300.000m³ ou mais de GNV/mês e mais dois bicos na estação de bombas, o compressor instalado no posto da autora pode trabalhar nos valores constantes nos gráficos da referida proposta comercial" (f. 333).
 
Pelas informações trazidas no laudo pericial, resta claro que a proposta, como ofertada pela empresa ré, com apenas 04 (quatro) bicos, jamais seria capaz de atingir a performance prometida pela empresa ré.
 
Não há dúvidas que a empresa ré falhou no seu dever de informação e violou os princípios da transparência e da boa-fé contratual, ensejando, desta forma, o dever de reparar os prejuízos causados, conforme estabelecidos nos artigo 186 e 927 do Código Civil.

Consequentemente, deve ser a ré condenada ao pagamento da diferença entre a energia elétrica efetivamente consumida e aquela por eles informada na proposta comercial, o que se fará em liquidação de sentença.

Comprovada a responsabilidade da ré e seu dever de indenizar, passo à análise da lide secundária, cognoscível por força do efeito devolutivo na profundidade (art. 1.013, §§ 1º e 2º do Código de Processo Civil).

A empresa Neuman & Esser América do Sul Ltda. denunciou à lide a requerida ACE Seguradora S/A. em razão do Contrato de Responsabilidade Civil - RCG, representado pela apólice nº 28.51.0006722.12.(165).

Em resposta à denunciação à lide (f. 192/197), a denunciada alega que há época do evento não existia Contrato de Seguro entre as partes.

Com efeito, a denunciação da lide faz nascer, ao lado da ação principal, uma demanda paralela, que pende entre denunciante e denunciado e que tem por objeto o reconhecimento da obrigação de o denunciado responder perante o denunciante pela indenização que este vier a pagar ao autor.

Depreende-se da apólice juntada às f. 165 que a vigência do seguro teria início no dia 24/09/2006 até 24/09/2007 (f. 165).

Dispõe a cláusula 1.3.1 das condições especiais para o seguro de responsabilidade civil produtos que:

"1.3.1 - Na situação acima, considerar-se-a como data do sinistro o dia em que ocorreu o dano primeiramente conhecido pelo segurado, mesmo que o terceiro prejudicado não tenha apresentado reclamação" (f. 217).

A empresa ré tomou conhecimento inequívoco do evento narrado na inicial aos 24/10/2004, data em que respondeu a notificação enviada pelo autor (f. 77).

Assim, não há como se exigir da seguradora qualquer pagamento de indenização tendo em vista que, na data da ocorrência do sinistro, o contrato de seguro não se encontrava vigente.

Com estas considerações, dou provimento ao recurso para: A) condenar a empresa ré a pagar ao autor o valor correspondente à diferença entre a energia elétrica efetivamente consumida e aquela por eles informada na proposta comercial, o que se fará em liquidação de sentença; B) determinar que os valores devidos sejam corrigidos monetariamente pela tabela da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Mina Gerais, a partir da data da instalação dos compressores de GNV e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a contar da data da citação.

Condeno a empresa ré ao pagamento das custas processuais, inclusive recursais e honorários advocatícios que fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da condenação.

Julgo improcedente a lide secundária e condeno o denunciante no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 10% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da condenação.

JD. CONVOCADO JOEMILSON LOPES - De acordo com o (a) Relator (a).

DES. ANTÔNIO BISPO - De acordo com o (a) Relator (a).

SÚMULA: "REJEITARAM A PRELIMINAR SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO E JULGARAM IMPROCEDENTE A LIDE SECUNDÁRIA"

@smr.advocacia @smr.advogados
 
Copyright ©2019. Portal do Advogado online em Belo Horizonte .
Powered by SMR ADVOGADOS. @smr.advocacia @smr.advogados Marz Rodriques.